quarta-feira, 30 de março de 2011

Comentários sobre o CD.

Gostei muito de “Encruzilhada”, 4º disco de Jefferson Gonçalves, um dos melhores gaitistas brasileiros do momento. Especialista em gaita diatônica (também chamada de gaita de blues), Jefferson também toca na cromática (gaita de chave), aquela que o Toots, o grande harmonicista de jazz, usa.

Jefferson é um artista interessante, com boa presença de palco, linguajar fluente, que viaja o País inteiro fazendo shows, workshops e também atua no exterior (Estados Unidos, Europa, África e América Latina). Seu trabalho de mais de uma década, sempre voltado para os toques de baião, maracatu, samba rural e outras nordestinidades, ficou robusto, bem produzido neste “Encruzilhada”.

A “sanfona de boca”, que muitas vezes lembra os baiões de Gonzaga e o realejo de Tavares da Gaita (que aos 78 anos teve um lindo CD produzido por Jefferson), também passa pelo universo bluseiro de Bob Dylan. Baseado em “blues com rapadura”, Jefferson universaliza sua criação impregnada de consistente brasilidade interiorana, de cantos de lavadeira, de moleques de rua e dos feirantes nordestinos. Células rítmicas que lembram tocadores de rabeca e pífanos, sempre presentes em quase todas as músicas, criaram uma paisagem sonora interessante e original.

O CD tem uma banda base coesa e bem ensaiada, que fez o alicerce do disco. Kleber Dias, Sergio Velasco, Anderson Moraes, Marco Bz e Fábio Mesquita deram conta do recado, tocaram fluentemente, e os convidados, que são muitos, deitaram e rolaram nos complementos.

Este é um CD que eu, tranquilamente, com prazer e alegria, recomendo e assino embaixo.

Zelação!

Rildo Hora (Março de 2011)


Não são poucas as culturas que têm as encruzilhadas como representações de dilemas e de escolhas. A mitologia grega transborda exemplos. As religiões orientais e ocidentais, idem. Os cafundós do Nordeste brasileiro também contam histórias mil a esse respeito - histórias que, sem que eu possa nem queira aqui escapar da imagem, se cruzam com a mística do Mississipi profundo e, voltando muitos passos, com a da África ancestral.

Encruzilhadas estão, podemos afirmar, presentes em todas as culturas, presentes na essência humana.

Pois Jefferson Gonçalves, músico da melhor cepa, enxerga essas encruzilhadas com acuidade exemplar. E foi buscar nas sonoridades múltiplas dos cantos por onde passou e dos cantos que ouviu as melhores referências para este CD, reunindo convidados do melhor naipe.

Após conhecer Encruzilhada em primeira audição, pelo que me julgo privilegiado, escutando cada música nota por nota, concluí que as escolhas de Jefferson emprestam a ele um caráter especial. É o caráter daquele que fez um pacto com a música boa e honesta e, fundamentalmente, com a responsabilidade de ousar.

Roberto Maciel – Jornalista (Março 2011)

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